domingo, 9 de outubro de 2011

3. entrevistas conduzidas por Alexandre Manuel (1969-76)

- As palavras «noite» e «madrugada» aparecem com insistência nos títulos dos seus livros. Tem o facto alguma sugestão especial?


Já me têm chamado a atenção para essa alegoria antinómica, que decerto sugere quanto tudo na vida reflecte uma dialética de oposições; quanto tudo na vida é noite (desespero, resignação, sofrimento) e manhã (renovo, alívio, fé), ou a tensa perspectiva de um desses estados, com a sua eventual representação objectiva. No meu caso, haverá ainda outros componentes no espectro de tais vocábulos. A noite, só por si, vivo-a como a explosão de contradições, uma irrealidade de negrumes de mistura com um fulgor ofuscante, que o dia dissolve na luz concreta. Sou um insoniado. A noite inventa-me ou exacerba-me conflitos e observa-os sob uma lógica específica; o dia restitui-lhes a exacta ou falsa dimensão.




Fernando Namora, in Encontros (Lisboa, 1979-81)

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